quinta-feira, 26 de maio de 2016

TB'16 - Expedição TAXPOmol Biodescoberta 2016 (Dia 15)

FERNANDO DE NORONHA

14º dia da expedição (21/04/2016). Nossos dois primeiros mergulhos com a Atlantis (www.atlantisdivers.com.br). Sendo o que é para os aficcionados pelo mergulho em águas brasileiras, até que Fernando de Noronha carece de um número mais expressivo de operadoras de mergulho. O fato é que a Atlantis e a Águas Claras são referência no assunto do mergulho embarcado, seguidas por Noronha Divers a uma certa distância. Afora isso, pareceu-me só haver a alternativa do mergulho de praia, do qual falamos na postagem anterior. 

Nossa expectativa era, portanto, enorme! Não podíamos ter sido mais bem recebidos na operadora, e temos de agradecer nosso interlocutor, o Sr Ismael Escote, que não sossegou enquanto não conseguiu encaixar nossos objetivos de pesquisa no cronograma da empresa. Tínhamos agora certeza de que nossos principais objetivos seriam cumpridos, o que nos tranquilizava quanto ao investimento feito na expedição, diga-se de passagem, de recursos públicos outorgados pela CAPES/MEC, e no caso específico do trecho de Noronha, também da FAPESP.

O primeiro mergulho programado para este dia, informação que só se torna pública uma vez que já estejamos embarcados, foi na Lage Dois Irmãos. Estava prevista uma imersão na faixa dos 20-25 m de profundidade, e esperava-se que poderíamos encontrar aí a esponja mais emblemática de Noronha, também conhecida por Grande Esponja Barril, a Xestospongia muta.



E não é que encontramos mesmo?! A Grande Esponja Barril (do inglês Great Barrel Sponge), na região caribenha conhecida também como "Redwood of the Reef", em função de seu grande tamanho e idade avançada presumida. A espécie era relativamente comum na Laje Dois Irmãos, porém não chegamos a ver espécimes com sequer 1m de largura. Estes da foto têm possivelmente 50-60 cm cada.
Autores estadunidenses calcularam que um espécime de Xestospongia muta, a esponja de que estamos falando, com mais de 1m de largura teriam ao menos 100 anos de idade. Os poucos espécimes com mais de 2m de largura, cerca de 2000 anos! Isso sugere que possa se tratar dos animais mais velhos do planeta, mas há controvérsias quanto aos métodos utilizados para inferir a idade de uma esponja. Steven McMurray, da equipe do pesquisador Joseph Pawlik (Universidade da Carolina - Wilmington), utilizou imagens digitais de vários espécimes acompanhados por um período de 4 e 1/2 anos para avaliar o crescimento volumétrico dessas esponjas. [McMurray et al 2008 Marine Biology 155, 159-171]

O trabalho do taxônomo de Porifera envolve inevitável contato com o substrato. Selecionar amostras de material biológico, seja com auxílio de faca, seja de marreta e talhadeira, a tomada de imagens com a melhor qualidade possível no que tange ao foco, à iluminação e o uso de escalas, e a triagem destas amostras em suas respectivas bolsas previamente numeradas, não é algo que se possa fazer apenas flutuando. Nem muito menos de cabeça para baixo, uma das poucas forma de assegurar que seus pés não tocarão algum outro ser vivo inadvertidamente - descontadas as águas-vivas ... Mas o fato é que nosso trabalho causou muita estranheza à muita gente, gerando inclusive ameaças de suspensão da licença de pesquisa. Prefiro não aprofundar o tema. Julgamos que trabalhamos com responsabilidade dentro de nossas possibilidades. Se falta treinamento, a pergunta que fica no ar é óbvia: "Quem vai pagar por isso?"

Outra esponja que chama bastante a atenção em Fernando de Noronha é a Ectyoplasia ferox. Este espécime também da Laje Dois Irmãos tinha mais de 60-70 cm de largura. Essa é outra espécie que se supõe distribuída no Brasil e também na Região do Caribe, de onde foi descrita originalmente, e como tal, uma opção de modelo de estudo para nós. Mas não foi desta vez. Já tínhamos modelos demais, e faltava-nos recursos (humano e de capital) para processar tudo.

Ao fim do mergulho, nos 3 minutinhos de parada de segurança que se faz por volta dos 5 m de profundidade, é quando temos a oportunidade de olhar algo além daquilo que cresce agarrado às rochas do fundo. Não raro aparecem peixes de bom tamanho, como esta sernambiguara.

Mais frequentes ainda são as barracudas.



O segundo mergulho deste dia foi na Ilha do Meio. Quanta esponja!?!? Especialmente sob as lajes, e dentro das caverninhas que ocorrem no local. Foi de tirar o fôlego, e ao contrário dos turistas que tendem a preferir mergulhar em locais diferentes todos os dias, ficamos contentíssimos por ter tido a oportunidade de repetir esse mergulho como mergulho de despedida de Fernando de Noronha. Mas disto trataremos em outra postagem ...


A diversidade de crostas, cada qual com sua exuberância cromática é algo que não deixa de nos surpreender. Frequentemente é muito difícil ter certeza que determinada espécie já tenha sido coletada, pois mesmo dentre as crostas mais semelhantes, não raro encontramos 2, 3, ou mais espécies. Esta crosta alaranjada recebeu o código MNRJ 20125. A curiosidade é grande! Pena que os materiais coletados ainda não chegaram ao Rio de Janeiro.

MNRJ 20166, a esponja vermelha à esquerda, é uma Phorbas amaranthus. Ou melhor, ao menos enquanto nossa comparação de materiais brasileiros e caribenhos não contrariar essa hipótese. Descrita originalmente do Caribe, as crateras na superfície desta esponja são denominadas de crivos, ou áreas porais aureoladas. Aí estão concentrados os poros, sendo por onde a água é sugada para o interior do animal. Ainda nesta foto, uma Monanchora arbuscula ao fundo (rosada), e duas esponjas não identificadas à direita, uma sobre a outra. Reparem que a alaranjada também possui crivos, como a Phorbas, só que menores. Esta característica, por si só, sugere tratar-se de uma Crellidae ou uma Hymedesmiidae, famílias da Ordem Poecilosclerida.

Hora de retornar ao barco, ao porto, à pousada, à triagem e preservação das amostras, ao banho (nas raras oportunidades em que havia água para tal ...), para finalmente podermos almoçar. Essa conta não fechava, e o almoço acabava ficando com cara de jantar. A balança de casa comprovou a eficiência desta dieta!

2 comentários:

  1. Fala chefia, belíssimas fotos! Se não for vc pra postar, André não mostra nada... Tenho visto muitas crostas com áreas porais ultimamente, inclusive tinha até comentado com Sula.

    O peixão lá em cima não é um Xaréu, mas uma Sernambiquara/Pampo, Trachinotus falcatus. Belíssimo, diga-se de passagem.

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  2. Valeu Vitão! Preciso dar uma recauchutada em minha Ictiologia. Vou ajeitar o nome do peixe. Estou devendo mais postagens, mas cadê o tempo? Hoje mesmo já estou embarcando para o STRI, onde até segunda ordem, estaremos sem internet. Ôh beleza!

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